27 de dez. de 2010

O Senhor dos vasos

Definitivamente ele era um oleiro como nenhum outro, conhecido por sua habilidade em transformar vasos quebrados e imperfeitos nos mais belos e inigualáveis. Não havia outro como ele, ele era único. Até ele se achegavam todos os tipos de vasos, os mais diversos, velhos, novos, marcados pelo tempo, defeituosos, alguns com pequenos arranhões, já outros com perda total. Contudo nada era impossível pra ele, por mais duro que fosse o vaso ele conseguia moldá-lo e fazer um vaso novo. Cada imperfeição por mais escondida que estivesse não escapava ao olhar observador daquele singular oleiro. Os vasos que passavam por suas mãos se tornavam irreconhecíveis, não era á toa que os desfazia e refazia conforme a sua vontade. Nenhum vaso era imperfeito demais para fazê-lo desistir. Os vasos abandonados também eram sua especialidade, tinha um apreço enorme por estes. Tirava o barro daqui, preenchia ali e depois os chamava de seus. O mais surpreendente é que após adquiri-los este oleiro não se desfazia de nenhum dos seus vasos, nenhum preço os compraria. Aqueles vasos outrora vazios, sem água, sem flores, são agora de extrema utilidade na casa do oleiro e para o oleiro. Ele mal podia esperar pra terminar cada vaso, embora tivesse a paciência que cada um necessitasse, desejava ardentemente que todos ficassem restaurados outra vez. Depois de todo o processo na olaria, o oleiro fazia um diferente acabamento em seus vasos, ele os enchia com óleo de maneira que até transbordasse. A partir daquele momento qualquer pessoa que olhasse, ainda que de relance, saberia que eles pertenciam ao Senhor dos vasos. Não era de se admirar, pois conforme o tempo passava os vasos se tornavam cada vez mais semelhantes ao seu dono.  

[Eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel]. 
Jeremias 18.6b.

26 de dez. de 2010

_leva-me pelas mãos_

Ela largou sua mão e seguiu em frente. Chegou o mais longe que pode, andou, andou, mas não chegou a lugar algum. Naquele caminho desconhecido ela ia tropeçando nas pedras, se arranhando nos espinhos, contudo não olhou para trás. Ela continuou como se tudo estivesse bem, mas não estava. Aquela estrada era longa demais, era como se estivesse andando em círculos e no fim de cada tarde só lhe restava o cansaço. Dia a dia foi se frustrando, decepcionando, o fardo ficou pesado. A estrada ficou escura, ela não conseguia sequer dar um passo em direção alguma. Então permaneceu ali, parada, estagnada, assustada. Naquele momento de total inércia percebeu o quanto eram impotentes suas próprias forças. Ela chorou, seu coração estava despedaçado de saudades. Tudo o que queria era segurar sua mão novamente e ser guiada por ele. A sua ausência a fez perceber que ela era tão pequena e efêmera, e que sua independência era na realidade a escravidão. A verdade é que ela nunca foi tão livre quanto na presença dele. Após certo tempo ela olhou pra trás e mesmo com poucas forças correu e enquanto fazia isso só conseguia recordar o quanto era feliz. Ele a fazia completa. Ela voltou e segurou sua mão tão forte, que mesmo sem dizer uma palavra, qualquer um perceberia que seus olhos imploravam pra que ele nunca mais a deixasse ir. Ela estava diante dele, toda maltrapilha, suja, sem nada a oferecer, mas ele a aceitou de volta como se ela nunca tivesse partido. Apressadamente ele retirou toda aquela carga que ela carregara e colocou em suas costas, tomou pra si todos os conflitos daquela menina e as feridas adquiridas durante o tempo em que esteve fora ele mesmo cuidou, uma a uma.  Não havia em todo o universo outro lugar em que ela desejasse estar. Ao mesmo tempo em que se sentia envergonhada era renovada. Finalmente ela estava em casa, no seu lar, doce lar. Naquele momento ela queria expressar o quanto ele significava em sua vida. Desejou com todo o seu ser que ele soubesse que o motivo dela ter voltado era ele, somente ele. Não havia nada mais que significasse tanto. Enquanto esteve longe se sentiu como órfã. Ela não tinha pra onde ir. Pois somente ali ela encontraria as suas palavras. As palavras de vida. De vida eterna.

[Senhor, para onde iremos nós? Tu tens as palavras de vida eterna.
João 6.68.]